Profissionais e empresas agora respiram um pouco mais aliviados: a famigerada crise já dá sinais de estar sendo vencida, embora não na velocidade e na dimensão que todos gostariam. Ainda é pouco, mas, diante das catastróficas previsões que foram feitas no seu auge, nos primeiros meses do ano, já é um bom motivo para se acreditar que o pior já passou e que a vida continua como antes.
Muitas seqüelas emocionais – além das financeiras - ficaram e vão continuar por algum tempo. Empregos foram perdidos, oportunidades foram deixadas de lado, planos e projetos foram adiados e muitas empresas, se não fecharam, tiveram seus alicerces comprometidos e perderam a solidez de antes. Há, agora, para todos, um longo e difícil caminho de recuperação – certamente possível, mas nem por isso mais fácil.

Antes da crise, muitas empresas que vinham desenvolvendo excelentes programas voltados para a melhoria do clima interno, com ótimas políticas de integração, motivação, comunicação, saúde, qualidade de vida, benefícios e outros. De repente, veio a crise e o sonho acabou – ou foi drasticamente interrompido. Para as empresas, vendas e produção caíram e, como conseqüência, os resultados finais seguiram o mesmo caminho. Os funcionários viram seus colegas perderem os empregos, assistiram desconsolados a suspensão ou cancelamento dos programas de melhoria do clima e qualidade de vida - e alguns até negociaram para baixo seus salários para manter o emprego.
Que conseqüências comportamentais pode-se esperar de tudo isso? A insegurança permanece entre os profissionais, porque há o natural receio de que a crise ressurja forte como no começo. E, se isso acontecer, quem serão os próximos “sacrificados”? Se, no auge da crise, profissionais tão dedicados e competentes saíram, por que não sairia quem ficou e achava que tinha escapado? Quais os critérios que, na crise, foram adotados para escolher os demitidos? E quais serão adotados se a empresa precisar “enxugar” ainda mais seus custos? Contarão pontos a lealdade, o comprometimento, a dedicação, o tempo de casa, os bons serviços prestados, os ótimos resultados atingidos no passado? Deve haver funcionários se perguntando: por que a empresa mandou “fulano” embora, se era tão competente? Por que não mandou o “sicrano”, que é notoriamente menos capaz?
Essas são feridas que precisam ser tratadas daqui para frente e cabe às empresas que fizeram demissões refletir a respeito e avaliar se existem tais feridas na sua estrutura, no seu clima interno. Para consolidar a vitória definitiva sobre a crise, não convém a nenhuma empresa conviver com um ambiente de desconfiança, insegurança e ressentimentos. Onde houver seqüelas, será preciso recuperar a amizade, a admiração, a confiança, o comprometimento de toda a equipe. Precisará ser feito um pacto sincero, profissional, positivo, consistente de “começar de novo”.Este será um trabalho delicado – mas fundamental. Um trabalho transparente e convincente de diálogo, feito por profissionais qualificados e experientes, capazes de interagir e estabelecer empatia com todos os colaboradores para entender as razões dos sentimentos e expectativas de cada um. Não se trata de justificar as demissões, mas de esclarecer as causas globais da crise, a situação em que a empresa ficou, as conseqüências naturais e a necessidade de medidas de sobrevivência geradas a partir daí. É indispensável que esse trabalho seja focado nas novas atitudes, condutas e políticas que passam a ser necessárias, daqui para frente, para a empresa retomar o crescimento anterior. Mas para que esse trabalho atinja o efeito desejado, é preciso que haja credibilidade e boa vontade em todo o processo. Recuperar confiança é muito mais difícil do que inspirá-la.
Acredito que muitas empresas e profissionais compartilharão desta nova preocupação com a relação capital/trabalho pós-crise e tratarão de fazer o que deve ser feito. Mas poderá haver quem não a ache relevante – e nada farão a respeito. Na minha modesta opinião, a opção por qualquer uma dessas duas posturas fará toda a diferença do mundo para a empresa que pretenda voltar a crescer. Como em tudo na vida, aqui também é uma questão de escolha.
* O autor é psicólogo, consultor e palestrante, presidente da SOMMA4 Projetos em Gestão de Pessoas. É autor de vários livros e inúmeros artigos sobre o comportamento humano. Ex-diretor de RH e Qualidade de Vida de empresas nacionais e multinacionais.
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