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7.29.2009

Cresce a busca por avaliação individual

Por: Roberta Lippi - Valor Econômico

Recursos Humanos: Com assessoria externa, empresas mapeiam habilidades dos funcionários na crise.

A Syngenta, uma das empresas líderes mundiais na área de agronegócios, tem experimentado um crescimento significativo no Brasil. A companhia dobrou de tamanho entre 2004 e 2008 e as perspectivas são de que esse movimento de expansão continue nos próximos anos. Motivo de comemoração por um lado, fator preocupante por outro. Afinal, para que o crescimento seja sustentado, a organização precisa preparar as pessoas que estão lá dentro.

O trabalho começou a ser feito em 2008, puxado por um profissional, digamos, inusitado: o CFO (Chief Financial Officer) para a América Latina Daniel Bachner. Tomando a frente de um movimento que em geral parte da área de recursos humanos, o executivo contratou uma consultoria externa e introduziu um projeto piloto para todos os funcionários da diretoria financeira, que conta com cerca de 180 pessoas. "Não dava para esperar", conta ele.
Em vez de investir no treinamento do time de uma forma desestruturada, Bachner optou por focar as necessidades da organização. E, para isso, escolheu como metodologia o assessment, termo já bem habitual nas rodas de recursos humanos e que ganhou peso após o estouro da crise. O assessment é um modelo de avaliação individual de profissionais que visa minimizar a subjetividade nas promoções, recrutamentos internos, seleção, processos de sucessão e até mesmo fusões e aquisições.
Utilizando-se de questionários e entrevistas para identificar perfis e os chamados gaps de competências da organização, a metodologia pode apontar características de personalidade e também quais são os pontos fortes e fracos de cada profissional para que, a partir dos resultados, sejam traçados planos de treinamento e desenvolvimento. Em tese, o objetivo é prever, na medida do possível, o potencial que cada funcionário pode alcançar em um determinado horizonte de tempo.

No mercado de RH, o que inclui as empresas de recrutamento de executivos, o assessment virou o queridinho da vez e, em tempos de crise, a maior procura pelo serviço tem compensado parte da queda de receita com as contratações. "As empresas ficam mais preocupadas em buscar as competências que não têm hoje", explica Francisco Ramirez, sócio-diretor da ARC Executive Talent Recruiting.

A oferta desse tipo de serviço nas empresas de recrutamento não é de hoje. A partir de 2002 e 2003, quando houve um movimento de enxugamento no setor, muitas consultorias do ramo buscaram uma saída investindo em novos negócios como assessment, coaching e mentoring para executivos. A Korn/Ferry, por exemplo, não só oferece o serviço como criou sua própria metodologia de avaliação para o assessment.

Após a crise financeira, esses negócios paralelos voltaram a crescer e o assessment, em particular, tem sido um dos mais procurados pelas empresas. O headhunter Robert Wong, por exemplo, afirma que a demanda por esse serviço em sua consultoria aumentou entre 30% e 40% desde o início do ano, tornando-se responsável por quase a metade do faturamento da empresa após a redução dos trabalhos de recrutamento e seleção. A ARC, que atua nos níveis de alta gerência para cima, fechou quatro grandes projetos de assessment no primeiro semestre deste ano, número que já supera o total de contratos fechados em 2008.

A forma como essa avaliação é aplicada nas organizações varia de acordo com a demanda da empresa e com a metodologia da consultoria que vai aplicá-lo. A recomendação dos especialistas é que, para ter maior efetividade, o processo deve ser feito sob medida, a partir das competências mais importantes para a estratégia de cada organização- como capacidade de negociação, liderança e planejamento. Em geral, são aplicados testes on-line e realizadas entrevistas individuais. Mas, em algumas situações específicas, são usados também estudos de caso visando avaliar o comportamento do profissional diante de determinada situação.

Na Syngenta, o primeiro passo do processo foi a definição pela diretoria financeira, com o apoio da consultoria e da área de RH, de uma lista de 10 competências essenciais. Metade delas era referente a habilidades globais de liderança e as demais eram mais importantes para a área em questão, todas ligadas ao planejamento estratégico da companhia. Cada uma delas foi subdividida em cinco níveis hierárquicos -já que não se pode, por exemplo, cobrar o mesmo nível de capacidade de negociação de um analista e de um diretor. Apesar de os programas de assessment serem geralmente aplicados apenas para níveis de liderança, o CFO da multinacional de agronegócios decidiu estendê-lo a todos os colaboradores da área.

Após a etapa das avaliações e entrevistas, cada funcionário (inclusive o próprio diretor) recebeu um calhamaço de quase 20 páginas relatando a "fotografia" apresentada pelo assessment, seguido de um feedback individual com um consultor. "O resultado mostrou um 'gap' muito maior do que a gente imaginava para os próximos cinco anos. Mas foi muito bom porque vimos quais seriam os buracos, enumeramos as competências prioritárias e traçamos planos de desenvolvimento", conta Bachner. Segundo ele, o modelo agora está se estendendo para o restante da organização.

Eleni Adami, coordenadora de processos da Syngenta, ficou responsável por administrar os planos de desenvolvimento da equipe estabelecidos após o assessment. E ela já percebe os resultados, inclusive em relação à própria carreira. "A minha avaliação mostrou que eu tinha um perfil muito apaziguador, e no feedback me mostraram que faltava um maior posicionamento, aquele conflito saudável. Depois disso, comecei a me policiar e os colegas já têm sinalizado que notaram a mudança", conta.

Na Serasa Experian, empresa de análise e serviços de crédito, o assessment já faz parte da cultura. A primeira aplicação foi realizada em 2001, e os processos têm se repetido a cada quatro anos. Todos os mais de 400 líderes da organização passaram pela avaliação. "Para ter credibilidade, a ação tem que ser contínua", diz o gerente executivo de desenvolvimento humano, Élcio Trajano. Para mapear as lideranças da empresa, a Serasa cruza essa avaliação de potencial com os indicadores de desempenho, chegando a uma matriz própria utilizada para movimentos internos como promoções e sucessão.

Apesar de ter seus bons resultados comprovados, o método demanda uma série de cuidados, alertam os especialistas. E um deles é para que o objetivo principal do assessment não seja distorcido. Diversos consultores afirmaram que muitas empresas que estão reduzindo quadros buscam o assessment com o argumento de ter mais justiça e critério nessas decisões. O assunto é polêmico.

"Essa não é uma ferramenta de crise, mas sim de desenvolvimento. O gestor não pode querer terceirizar a decisão de demitir usando os testes como desculpa", diz Karin Parodi, sócia-fundadora da Career Center, empresa focada em gestão de RH e carreira que aplica a metodologia desde 2005. "Nós não aceitamos trabalhar com empresas que nos procuram com esse objetivo", diz ela. Na consultoria, a demanda por esse instrumento de avaliação de profissionais já vinha crescendo fortemente antes mesmo da crise. Entre 2007 e 2008, a receita da área cresceu 200%. "Começamos há quatro anos com um único grande cliente. Agora, somente neste semestre, estamos aplicando em 29 empresas", conta a consultora, que tem uma equipe de 12 pessoas especializadas em assessment.

Para Karin, a avaliação deve ter a linguagem da empresa, por isso é importante que cada trabalho seja personalizado. "Foco no cliente é uma competência essencial para uma empresa de varejo. Numa petroquímica seria bem diferente", explica.

A diretora da área de talentos da Right Management, Marisabel Ribeiro, concorda que o assessment não pode ser padronizado. "Ele tem que mostrar como eu estou naquela competência para aquela organização", afirma. Outro ponto importante é que os gestores não devem utilizar o método para rotular as pessoas. "A avaliação refere-se a comportamentos, é uma fotografia de como a pessoa está naquele momento", diz Marisabel. No último ano, segundo ela, a metodologia utilizada pela Rightf oi modernizada e com isso o serviço cresceu em volume e proficiência.

Vicky Bloch, consultora de gestão de pessoas e carreiras, tem uma visão bastante crítica em relação ao assunto. "Não vou dizer que isso é uma bobagem, porque pode ser bem feito e bem utilizado, mas já vi muita coisa indigna nas empresas usando a justificativa do assessment", argumenta. Segundo a consultora, um dos cuidados mais importantes que uma organização deve ter ao contratar esse serviço é assegurar-se de que os profissionais que irão atendê-la têm perfil, conhecimento e formação específica.

Por esse motivo, ela é reticente, por exemplo, aos casos de headhunters que fazem assessment sem ter formação para atuar com desenvolvimento profissional. "O olhar de quem faz contratação é diferente do olhar do assessment. Quem faz search (busca de profissionais) tende a julgar as pessoas, e não a pensar no seu crescimento e desenvolvimento", diz ela. "E quem tem essa visão não consegue ir além da avaliação, não consegue trazer dados para o crescimento do indivíduo."

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