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6.22.2009

A ocasião faz o ladrão...

...mas não convém esquecer nenhum documento no local do crime!

Por: Marco Zanfra - Blog Fala, Zanfra

Lembro-me de um ex-colega de escola – ele havia estudado comigo ainda no curso primário, e não acredito que tenha frequentado por muito mais tempo os bancos escolares – que foi um exemplo cabal da situação acima: aproveitou a ocasião e virou ladrão, mas deixou cair sua carteira profissional na cena do crime e acabou sendo identificado e preso.

A ocasião apresentou-se num bar (que ele frequentava com assiduidade), logo após a entrega das bebidas: o dono do estabelecimento deu uma rápida saidinha do recinto e esse meu colega aproveitou-se de sua ausência para surrupiar um engradado de cerveja e correr com ele para casa. No ato de abaixar-se para guindar a caixa, ele deixou cair o documento e não percebeu.

É claro que o dono do bar podia ter considerado o fato de possuir certo conhecimento com o ladrão, poderia tê-lo procurado e pedido de volta sua mercadoria, e tudo ficaria por isso mesmo. Mas ele preferiu chamar a polícia. O resultado é que meu colega, um pobre pé-de-chinelo atrapalhado, acabou cumprindo pena por furto.
Algo semelhante aconteceu no Rio de Janeiro no final da semana passada: um dos três rapazes acusados de assaltar os passageiros de uma van em Campo Grande, na Zona Oeste, esqueceu a mochila dentro do veículo e com isso possibilitou sua identificação. O curioso é que, além da carteira com os documentos do rapaz, de 21 anos, os policiais encontraram um currículo profissional, desses usados na solicitação de emprego, onde o assaltante – que confessou o crime e entregou os dois comparsas – afirma ser “educado, de fácil trato” e ter “facilidade de trabalhar em equipe, muita vontade de crescer profissionalmente e disponibilidade de horário”.
Louve-se a provável intenção do rapaz de procurar um emprego – quem carregaria um currículo na bolsa se não tivesse esse propósito? – mas a somatória dos fatos nos remete a um clima de pastelão, de trapalhada, que é impossível deixar passar em branco. Olhando com os olhos de assistente social de minha mulher, dona Mary Kazue, o rapaz foi levado à opção criminosa pelo desemprego, foi carregado ao desespero pela impossibilidade de alimentar a família.

Tudo bem, até concordo. Só que perco a análise social mas não perco a piada. O caso deve ter certamente um enfoque assistencial, com pitadas de crise mundial, mas não deixa de ser engraçado. Principalmente porque uma das anotações no currículo do rapaz pode dar margem a uma, digamos, interpretação menos subjetiva: nos meios policiais, “facilidade de trabalhar em equipe” também é conhecida como “formação de quadrilha ou bando”.

Voltando a falar em curso primário: quando estava no último ano, disse inocentemente a meu pai que queria parar de estudar e ser motorista de ônibus. Quase apanhei. Em sua douta opinião, só quem estudava chegava a ser alguma coisa – não desmerecendo os motoristas de ônibus – e ele me obrigou a continuar na escola.

Como eu me tornaria jornalista e como para ser jornalista não é mais necessário diploma, segundo decisão recente do STF, esse esforço de meu pai para me manter nos bancos escolares não parece agora algo totalmente inútil e descabido?

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